As trilhas desenhadas pelos movimentos e práticas de
educação popular em saúde, apontam para a importância de sedimentar uma
reflexão – ação em educação popular por meio de um processo formador que possa
superar o caráter disciplinar e a
dissociação dos dilemas que constituem a
complexidade da vida popular,ultrapassando a descontextualização dos
conteúdos e a distância entre teoria e prática.
Assim as narrativas sobre a vida cotidiana dos
movimentos e práticas traduzidas nas
linguagens da arte, ao expressarem as diversas dimensões dessa vida
cotidiana, permitiram a realização de
uma suspensão crítica, capaz de historicizar e compor um desenho do percurso
formador capaz de estimular o apoio
mútuo e solidário na rede.
A recuperação das falas de cada
grupo/movimento/prática, abordando uma leitura crítica do vivido feita dessa
forma coletiva, pareceram-nos imprescindíveis na ultrapassagem da fragmentação
ao individualismo.
A busca de imagens de transformação(aquilo que os
grupos consideram que necessita ser transformado e seus
possíveis(potencialidades em curso e os embriões de futuro) e de
elementos comuns nas diferentes experiências grupais expressas como
situações limite ou forma pulsantes de
expressividade e projetos de futuro, nos levaram a pensar circuitos de produção cultural onde se
pudesse considerar, não apenas produtos(resultados concretos em termos de
qualidade de vida, mas também produção de sujeitos. È que essas práticas de
significação (escuta e fala coletivas) em algum momento do trabalho expressa-se
como produção cultural.
Acreditamos
não podermos perder de vista que essa percepção de significação dessa roda
possa acompanhar o crescimento de formas solidárias de cooperação, como passos
do momento mais crítico, analítico dessas realidades para um momento da
solidariedade sob a forma de uma ação concreta a ser construída na rede.
Essas narrativas vêm ocupando também os espaços
acadêmicos e interferindo no processo formativo dos estudantes da graduação dos
cursos da área da saúde. Um exemplo foi a vivência de leitura dramática
conduzida pelo grupo Semearte do Bom Jardim com alunos do curso de enfermagem
da UECE, para discussão sobre o Sistema Único de Saúde:
Meus senhores e senhoras
Que compõem essa platéia
Vamos saber da história
Dessa grande epopéia
Que a nossa periferia
Vive no seu dia-a-dia
E o grupo Semearte
Encena com muita arte
O que se passa com esse povo tão sofrido
Não é história inventada
É realidade encenada
Desse povo excluído
Todos
Ai, ai, ai, tô doente tô quebrado e o posto não me
atende
Ai, ai, ai, o tempo todo esperando e o posto me enrolando
Hip hop
Aqui no bairro a saúde é uma piada
Tem que sair de madrugada pra poder ser atendido
Mas depois de ter sofrido noite inteira numa fila
Tem gente que até cochila e não é recebido
E enquanto isso,
Por aí se ouve falar
De um tal sistema único
Que está a se organizar
Esse sistema de saúde
Dizem que é universal
Atendendo a todo mundo
Do pequeno ao maioral
Dizem, porém, que ele garante a eqüidade,
Pois quanto à necessidade,
Nem todo mundo é igual.
Esse tal SUS envolve o posto e o hospital
Corpo, mente e a cultura das pessoas
Numa ação que é integral.
Vamos juntar todo mundo
Boi , galante , catirina
Os doutor e as rezadeira
Vamos mudar nossa sina
Pois isso tudo só se faz com muita luta
E pra entrar nessa disputa
Precisa organização
E foi pra isso
que inventaram os conselhos
Paritários com os governos
Onde tem voz o cidadão.
( Trecho da tese de Doutorado em Educação: Dialogismo e Arte na Gestão em Saúde - Dra. Vera Dantas)
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